domingo, 17 de dezembro de 2017

STF deve derrubar condenação de Lula em 2ª. instância

REUTERS/Ueslei Marcelino

Já faz tempo que a Constituição brasileira foi rasgada e lançada no lixo, inclusive pelo Supremo Tribunal Federal, que teoricamente seria o seu guardião. Isso aconteceu mais precisamente quando do julgamento do chamado “mensalão”, onde a prova foi substituída pela teoria do domínio do fato, que serviu de base para a condenação do ex-ministro José Dirceu.  Depois,  o novo procedimento da “nova” Justiça se consolidou com  o afastamento da presidenta Dilma Roussef, consumado com a aprovação implícita da Suprema Corte, que fez vista grossa para a violação da Carta Magna, uma vez que não houve nenhum crime de responsabilidade que justificasse o seu impeachment. Todos tinham consciência disso, inclusive o Supremo. A partir daí desrespeitar  a Constituição e atropelar as leis virou rotina, com juízes de primeira instância fazendo suas próprias leis e sentenciando os réus com base em suas convicções, não em provas. Suprimiu-se a presunção de inocência e dispensou-se a exigência de provas, bastando pura e simplesmente um exercício de interpretação e a vontade do magistrado para condenar alguém.
A “nova” Justiça se fortaleceu com a Operação Lava-Jato, cujo comandante, o juiz de primeira instância Sergio Moro, ficou famoso por  prender preventivamente, mas de modo quase permanente,  poderosos empresários e parlamentares de destaque, proeza da qual se gaba publicamente e que lhe garantiu a admiração e aprovação  popular. Ele conquistou espaço cativo na mídia, transformando-se em pop star ao direcionar as baterias da operação para o ex-presidente Lula, que se tornou o seu principal alvo. Com isso, além de deixar cair a máscara, revelando ser a Lava-Jato um instrumento político a serviço da Direita, passou a usar a fama para cometer abusos condenados por juristas de renome, violando a Constituição e ignorando as leis. E nunca foi sequer advertido pela instância superior do Judiciário, que se mostrou intimidada diante da sua força junto à mídia, o que fortaleceu a sua posição como o homem mais poderoso do país, temido até pela Suprema Corte. Como consequência natural da sua impunidade, outros juizes de primeira instância passaram a seguir o seu exemplo. E a “nova” Justiça, sem presunção de inocência,  sem prova e escandalosamente política, passou a predominar no Judiciário brasileiro. 
Depois que o ministro Joaquim Barbosa saiu de cena – o primeiro magistrado que a mídia transformou em celebridade porque direcionou a sua atuação contra o PT  – Sergio Moro ocupou o lugar de caçador de petistas, não exatamente de corruptos, conquistando admiradores e seguidores dentro e fora do âmbito do Judiciário, mais precisamente entre os adversários de Lula. E com o apoio da grande imprensa, a mesma que apoiou o golpe, vem usando o seu poder com uma valiosa contribuição  na tarefa destinada a eliminar o ex-torneiro mecânico da vida pública, de modo a impedi-lo de voltar ao Palácio do Planalto. Torcendo as leis para atender aos objetivos fixados pelas forças da Direita, conforme amplamente denunciado, já condenou o ex-presidente operário a nove anos e meio de prisão por conta de um apartamento que não é dele, mesmo admitindo não ter provas sobre a propriedade do imóvel. Chegou, inclusive, a afirmar publicamente que não precisava de prova para condená-lo, seguindo o exemplo da ministra Rosa Weber, do STF, que condenou José Dirceu  mesmo confessando não ter provas, apenas porque a literatura jurídica “lhe permitia”. E essa condenação deverá ser confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª. Região, no dia 24 de janeiro,  seguindo o mesmo procedimento da “nova” Justiça. 
A certeza de que o TRF-4 vai confirmar a condenação de Lula decretada pelo juiz de Curitiba decorre, além da estreita amizade dos membros daquela Corte com Moro,  da posição sobre o processo dos desembargadores Thompson Flores e Gebran Neto, presidente e relator daquele tribunal, já manifestadas publicamente. O primeiro, antes mesmo de ler os autos,  considerou “irretocável” a sentença que condenou o ex-presidente, enquanto o segundo, em recente evento realizado em Buenos Aires, disse que “acabou a ingenuidade” nos julgamentos de casos de corrupção, nos quais não se deve esperar mais “uma prova insofismável” para  ”eventualmente condenar um acusado”, sendo bastante uma “prova acima de dúvida razoável”, desde que seja possível identificar uma “convergência” nos elementos probatórios de determinado processo. Ou seja, de acordo com a “nova” justiça hoje adotada não há necessidade de prova, apenas de “convergência”, conforme, evidentemente, a interpretação dos magistrados. Conclusão: Lula já está condenado em segunda instância mesmo sem provas. 
Aparentemente, a julgar por recentes despachos e declarações de alguns ministros do Supremo, a decisão do TRF-4 deverá ser derrubada  sem muita dificuldade, a não ser que até o ingresso dos recursos da defesa de Lula no STF eles  mudem o atual entendimento, premidos pela pressão da midia golpista que já comemora antecipadamente a condenação do líder petista em segunda instância e sua consequente prisão. O ministro  Celso de Mello, por exemplo, declarou em recente despacho no processo em que absolveu o ex-governador Ronaldo Lessa, que “em matéria de responsabilidade penal não se registra, no modelo constitucional brasileiro, qualquer possibilidade de o Judiciário, por simples presunção ou com fundamento em meras suspeitas, reconhecer a culpa do réu. Os princípios democráticos que informam o sistema jurídico nacional repelem qualquer ato estatal que transgrida o dogma de que não haverá culpa penal por presunção nem responsabilidade criminal por mera suspeita". Só esse despacho já derruba a “convergência” de Gebran.
O que poderá provocar a reação imprevisível do povo, portanto,  não é necessariamente a decisão do TRF-4 já conhecida antes mesmo da data do julgamento, mas o tempo que o Supremo demorará para julgar o recurso da defesa do ex-presidente e derrubar a sentença daquele tribunal. Se não quiser assumir essa posição de promotora da verdadeira justiça, contrariando a “nova” justiça da corte de Porto Alegre, a Suprema Corte pode simplesmente deixar escoar o tempo e vencer os prazos de registro da candidatura de Lula. Se, no entanto, quiser efetivamente fazer justiça e colocar as coisas em seus devidos lugares pode, de imediato, evitar as consequências funestas de uma revolta popular, promovendo a revisão  da decisão sobre prisão em segunda instância e impedindo que o ex-presidente operário seja preso. Na verdade, tudo isso poderia ser evitado se o Judiciário não se deixasse politizar e houvesse efetivamente justiça em nosso país, pois Lula nem seria transformado em réu em nenhum processo, por absoluta ausência de provas. E se pouparia tempo, dinheiro, aborrecimentos e decepções. Acredita-se mesmo que esse processo teria morrido no nascedouro se ainda estivesse na ativa, na Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça, uma mulher que entrou para a História como verdadeira guardiã do Direito e da Justiça: a ministra Eliana Calmon. (247).

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