Alimentos queimados podem fazer mal - Foto: Freepik
Existe algo mais tentador do que uma torrada dourada pela manhã? A textura e o sabor de alimentos tostados conquistam o paladar de muitas pessoas. No entanto, por trás do prazer que acarreta comê-los, uma questão fundamental deve ser observada para que a ingestão seja segura, pois, para que esses alimentos adquiram aquela cor tostada característica, são gerados componentes que podem causar danos ao organismo.
"Isso ocorre porque as proteínas e o açúcar presentes nos alimentos, quando expostos a altas temperaturas, produzem a reação de Maillard que modifica suas características físicas: faz mudar a cor (escurecem) e gerar substâncias saborosas e aromáticas muito tentadoras ao paladar, como o escurecimento do queijo gratinado", diz Yael Hasbani, especialista em nutrição holística.
No entanto, entre todo este conjunto de componentes que se formam, existe um em particular que não é totalmente saudável e que tem deixado os profissionais de saúde em alerta. Chamada de acrilamida, essa substância em excesso pode ser tóxica ao organismo, pois “estima-se que tenha possíveis efeitos nocivos no nível celular”, segundo Hasbani. Nas palavras da Food Standards Agency do Reino Unido, a acrilamida é um produto químico natural do processo de cozimento que sempre esteve presente nos alimentos.
Mas a verdade é que não ocorre em todos os alimentos igualmente, há alguns que têm mais riscos de desenvolvê-la.
Para a nutricionista do Departamento de Alimentação e Dietética do Hospital de Clínicas da Universidade de Buenos Aires (UBA), Alexa Gómez, os alimentos que apresentam maior predisposição à reação de Maillard ou torração com produção de acrilamida, são os torrados, salteados, fritos e assados, “métodos que levam pouco ou nenhum líquido”. Entre eles, destacam-se as batatas fritas, pães torrados, macarrão e carnes. A esta lista a especialista também acrescenta o café, “bebida submetida a um processo de torrefação prévia por grão”.
A descoberta da acrilamida data de 1912 e foi apresentada ao mundo pelo químico francês Louis-Camille Maillard, que buscava entender a mudança de cor dos alimentos quando submetidos ao calor. Por meio de suas investigações, percebeu que a alteração dos pigmentos ocorria devido à degradação de aminoácidos (proteínas) e açúcares quando expostos a altas temperaturas.
Diante dessa situação, ele percebeu que os alimentos passavam por quatro estágios de mudança, que dependiam da intensidade da temperatura e do tempo de cozimento. Na primeira etapa, quando a comida estava apenas começando a cozinhar, ele notou que a mudança de cor e textura era muito sutil, com apenas um leve tostado. Mas se continuasse cozinhando, a mutação se tornava cada vez mais evidente: começou a ficar dourada, depois marrom e por fim preta.
Que consequências a reação de Maillard tem para o corpo?
Para a nutricionista Estela Mazzei, a acrilamida é uma substância que em excesso pode ser tóxica ao organismo.
— Nestes casos, por vezes causa desconforto digestivo, incluindo gastrite e azia, como também está associado ao enfraquecimento do sistema imunológico, uma vez que faz com que as células do corpo inchem, se oxidem, envelheçam mais rapidamente e fiquem vulneráveis ao desenvolvimento de doenças crônicas.
Por sua vez, existem mitos populares que circulam de geração em geração que afirmam que se trata de um componente cancerígeno, mas a verdade, dizem os especialistas, é que até agora não há estudos suficientes para sustentar essa crença.
Mas além desses efeitos que a reação de Maillard tem no corpo, há outro fato a ser levado em consideração. Segundo Mazzei, quando os alimentos são cozidos, eles perdem parte de seu valor nutricional, principalmente os relacionados às proteínas e vitaminas. Nesse sentido, a pessoa não poderá adquirir todas as suas propriedades que, em última análise, são benéficas para manter as funções vitais do organismo. A esse respeito, ele comenta que a acrilamida começa a se formar quando a temperatura passa de 120 graus Celsius e acelera a partir de 150 graus Celsius.
Para evitar a acrilamida: alternativas culinárias
Ao longo da história, o homem utilizou diferentes métodos para preparar suas refeições e, segundo Gómez, eles se baseiam na segurança biológica porque, quando submetidos a altas temperaturas, eliminam seus patógenos. Os métodos também tinham o objetivo de melhorar as características da comida em relação à aparência, sabor e aroma, acrescenta o especialista.
Sem dúvida, cozinhar é um aspecto fundamental da vida das pessoas:
"Existem alimentos que devem ser cozidos devido a medidas de higiene e saúde , como os de origem animal ou certos vegetais" diz Hasbani. "Portanto, estamos constantemente expostos à acrilamida".
Mas não se assuste: a boa notícia é que existem estratégias para minimizá-la, até mesmo evitá-la.
A esse respeito, Gómez comenta que a batata, por exemplo, em vez de ser consumida frita ou assada, pode ser cozida ou amassada. Além disso, elas podem ser cortadas em fatias grossas em vez de finas para reduzir a chance de queimar. Quanto ao consumo de café, a especialista indica alternar com outras infusões como chá de ervas, como mate.
E para saber quanta acrilamida tem um alimento, Mazzei explica que muitas vezes é difícil saber ao certo, mas “quanto mais escura for a cor, maior a quantidade de acrilamida”.
"Outro fator de risco para a reação de Maillard são os utensílios usados para cozinhar", alerta Hasbani. "Por isso, é bom implementar técnicas alternativas".
Cozinhar legumes no vapor é uma das melhores formas de preparo, sendo ideal para batatas e batatas-doces. Estima-se que, para duas ou três batatas grandes, o tempo no vapor seja de aproximadamente 20 minutos.
Para encerrar, Gómez esclarece que, embora seja essencial estar informado sobre esta situação, “também não devemos eliminar completamente essas formas de cozinhar”.
"Pelo contrário, podemos evitar comer alimentos queimados e usar diferentes formas de preparo para não depender sempre de métodos que favoreçam a reação de Maillard".
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