Com causas ainda misteriosas para a medicina, ela atinge 3% dos brasileiros e tem tratamento multidisciplinar
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Por Cristiane Bomfim, da Agência Einstein - Por quatro anos, a analista administrativa Diomara Cantesani, de 55 anos, sofreu com dores físicas que médicos não conseguiam diagnosticar. No começo, doíam as articulações dos membros superiores, especialmente as das mãos. Com o tempo, elas ficaram mais intensas e alcançaram outras partes do corpo, como as pernas e o quadril. Quando os analgésicos e anti-inflamatórios comprados por conta nas farmácias já não faziam mais efeito, as idas ao pronto-socorro passaram a ser rotina. “A cada receita nova, o remédio era mais forte, mas ele não tratava a causa porque os médicos não sabiam o que eu tinha”, lembra. O diagnóstico de fibromialgia veio quando ela completou 40 anos e a dor alcançara um nível insuportável. “Até meu couro cabeludo doía. Quando eu falava, as pessoas não acreditavam”, lembra.
Segundo estimativas da Sociedade Brasileira de Reumatologia, a fibromialgia atinge cerca de 3% dos brasileiros – quase sete milhões de pessoas. Mistério para medicina e motivo de discordância entre especialistas, as causas das dores difusas pelo corpo que caracterizam a enfermidade ainda não estão totalmente esclarecidas, o que dificulta seu diagnóstico e seu tratamento. O que já se sabe é que a fibromialgia se manifesta com dores crônicas no corpo e sem motivo aparente. Elas dores podem estar associadas a outros sintomas, especialmente a fadiga, alterações no sono e distúrbios de humor, entre eles ansiedade e depressão.
“Não há exames clínicos ou de imagem que identifiquem a doença”, afirma o reumatologista Ari Stiel Radu Halpern, do Hospital Israelita Albert Einstein, de São Paulo. “Uma de suas características é a inexistência de inflamações ou infecções nos músculos e articulações” explica. A medicina também não consegue explicar ainda porque a enfermidade é mais frequente em mulheres, que representam nove a cada dez diagnósticos. Além disso, os sintomas podem ser diferentes de pessoa para pessoa. “Quando fazemos estudos observacionais não conseguimos comprovar a relação entre causa e efeito. Se soubéssemos a causa, a fibromialgia seria uma doença e não uma síndrome e os caminhos para tratamento seriam mais claros”, completa Halpern.
Outros sintomas que podem estar associados são a sensibilização do sistema nervoso central e uma menor densidade de fibras nervosas na epiderme. O primeiro é uma alteração neuroquímica que produz em maior quantidade substâncias quem amplificam a dor e em menor as que inibem a sensação. Já a segunda, recém descoberta por pesquisadores americanos, está relacionada à redução de fibras nervosas na epiderme (camada mais superior da pele), o que pode tornar dolorido um simples toque. “Mas somente cerca de 20% dos pacientes fibromiálgicos têm essa condição”, diz o reumatologista.
Diagnóstico
Por estes motivos, o diagnóstico da fibromialgia é clínico e eliminatório. O caminho para descoberta e tratamento às vezes é longo. Isso porque inicialmente os pacientes querem se livrar da dor e acabam recorrendo à automedicação com uso de analgésicos e anti-inflamatórios. Como as dores não cessam e até pioram, as consultas médicas com ortopedistas, reumatologistas ou médicos especializados em dor passam a ser consideradas. “O que fazemos é descartar, por meio de exames, todas as possíveis doenças que podem causar essas dores como as autoimunes, as inflamatórias e o hipotireoidismo. Nem sempre a resposta é rápida”, explica o anestesiologista George Miguel Góes Freire, coordenador da Equipe de Controle de Dor do Einstein.
Atualmente, é necessário a constatação de dor nos quatro quadrantes do corpo – partes superior e inferior e lados direito e esquerdo – por pelo menos três meses (o que caracterizam dores crônicas) e a associação com outros sintomas, especialmente ansiedade, distúrbios no sono, fadiga e depressão. Médicos psiquiatras e psicólogos ajudam não só no diagnóstico final como no tratamento da fibromialgia. “Nem sempre está associada à quadros psiquiátricos, mas acreditamos que a manifestação da síndrome também pode variar de acordo com a resposta emocional dos pacientes”, explica o psicólogo Thiago Amaro, do Einstein.
O tratamento
No tratamento da fibromialgia, o mais importante é a parte não medicamentosa. “Um dos poucos consensos que temos é que a prática de atividade física com regularidade é fundamental para reduzir as dores”, explica o reumatologista Halpern. Movimentar o corpo ajuda a evitar contraturas musculares, que podem ocorrer em pacientes com a síndrome. As contrações musculares ocorrem quando o músculo se contrai de forma incorreta e não consegue voltar ao seu estado normal no momento de relaxamento. “Este tipo de enrijecimento não é mostrado laboratorialmente, mas com exames de apalpação nas áreas doloridas. Tem que fazer o músculo se movimentar”, completa George Miguel Góes Freire, especialista em dor da instituição.
Diomara Cantesani conta que sempre menosprezou a prática de exercícios em seu tratamento. Foi somente há um ano que, depois de uma das mais fortes crises que teve, que iniciou uma rotina de exercícios de alongamento ou qualquer outro que lhe traga bem-estar. “Quando me movimento, sofro menos. Mas está difícil manter a rotina de exercícios”.
Higiene do sono e psicoterapia também são partes importantes no tratamento. “A qualidade ruim do sono está relacionada à ansiedade, ao estresse e à fadiga, sintomas que podem estar associados à fibromialgia”, explica o psicólogo Thiago Amaro. “Estudos mostram que não existem dor física que não tenha aspecto emocional. Por isso é importante esse tratamento multidisciplinar”, afirma o reumatologista Ari Stiel Radu Halpern.
As medicações são normalmente prescritas para tratamento específico da dor e não de doenças psiquiátricas. “Antidepressivos e anticonvulsivante, por exemplo, têm papel importante no controle da dor porque regulam neurotransmissores envolvidos no processamento da sensação”, diz o reumatologista. Neurotransmissores são substâncias que fazem a comunicação entre os neurônios. “Mas o foco do tratamento é a dor e não sintomas psiquiátricos”, explica Halpern.
O tratamento psiquiátrico é reservado aos pacientes com distúrbios mais graves, como depressões mais fortes e psicoses depressivas, mas como tudo em torno da fibromialgia, não é uma regra.
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