Na invasão dos aplicativos de mensagens da “Operação Lava Jato”, o hacker de Araraquara obteve mensagens do delegado Flávio Reis, da PF, destacado para ouvi-lo.
O estudante de Direito Walter Delgatti Neto, que está preso na Penitenciária de Araraquara e tem depoimento à Polícia Federal em Brasília marcado para as 13h30 desta 4ª feira, 16 de agosto, pretende ficar calado ante o delegado Flávio Vieteiz Reis, que é o coordenador do inquérito destinado a apurar os atos antidemocráticos e a invasão do sistema do Conselho Nacional de Justiça. Foi ele quem comandou a operação deflagrada na última semana na qual foi preso o ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal Silvinei Vasques. Nem Delgatti, nem o advogado dele, Ariovaldo Moreira, confiam na isenção do delegado federal para tomar o depoimento. Em 2019, no curso do hackeamento das mensagens trocadas entre os procuradores da finada “Operação Lava Jato” e o ex-juiz (considerado parcial) Sérgio Moro, Flávio Vieteiz Reis teve mensagens suas copiadas e abertas por Walter Delgatti. Elas integram o rol de provas coletadas pela “Operação Spoofing”, que prendeu o hacker em Araraquara quando a PF estava sob o comando de Moro (então ministro da Justiça do trágico governo de Jair Bolsonaro).
Reis usou uma manobra operacional para tomar o depoimento de Delgatti hoje, driblando a presença física do advogado Ariovaldo Moreira em Brasília: ontem à noite, um agente ligado a ele entrou em contato com Moreira perguntando se ele desejava receber um link para acompanhar à distância a oitiva com o cliente – pois ela se daria na sede da PF em Brasília e, como o depoimento fora marcado àquela hora (ou seja, sem prazo para a preparação da defesa), o advogado estaria em Araraquara. “Estou em Brasília e acompanharei o meu cliente pessoalmente”, informou Moreira. Deu-se, então, um certo desassossego no escritório do delegado encarregado do caso e responsável pelo atual encarceramento de Walter Delgatti. O hacker tem pouso previsto para as 12h30 na capita da República, em jato fretado pela Polícia Federal, e ficará custodiado na sede da PF até o depoimento que deve conceder amanhã, 5ª feira, às 9h, na Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que apura o golpe de Estado tentado pela extrema-direita contra as instituições democráticas brasileiras em 8 de janeiro. “À CPMI, o meu cliente pretende falar. Pretende. Ele tem uma história para contar. Porém, não há motivo algum para ele estar preso, e o responsável pela prisão indevida dele é o delegado Flávio Reis”, disse Ariovaldo Moreira na manhã de hoje, enquanto rascunhava providências legais para garantir a Delgatti a liberdade para falar e, sobretudo, a possibilidade de sair do atual encarceramento. “Walter está colaborando com a Justiça, tem dado todo o caminho da apuração para quem deve investigar a forma como ele foi cooptado por pessoas que podem ter agido contra as instituições democráticas. Não é justo que esteja privado da liberdade de ir e vir, de trabalhar, de procurar trabalho, de sobreviver”, assevera o advogado em seu protesto.
O Código de Processo Penal Brasileiro não prevê a figura da suspeição de delegados. Na prática, é a isso que a defesa d’”O Hacker de Araraquara” pretende recorrer – fazendo uma leitura por analogia do artigo 107 do CPP, que se refere a juízes – para tornar público o desconforto de Walter Delgatti Neto em depor para o delegado Flávio Reis. Há evidências seguras, segundo o advogado do hacker, de que Delgatti foi monitorado sob determinações de Reis até que cometesse algum ato que fosse compreendido como descumprimento de determinações legais e novamente o levassem à cadeia. Quando o hacker voltou a ser preso da última vez, no início deste mês, Flávio Reis tomou um depoimento “informal” do hacker, em São Paulo, sem a presença do advogado dele nem de defensores públicos ou do ministério público. Nesse depoimento “informal”, Delgatti contou o que pretende falar à CPMI, amanhã. Contudo, passou a não ter mais confiança na relação que poderia ter criado com o delegado federal. Na compreensão da defesa do hacker, Flávio Reis pode estar querendo “esquentar” as informações que obteve no depoimento informal e indevido. - Por Luís Costa Pinto, da sucursal do 247 em Brasília.
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