quinta-feira, 19 de março de 2020

Na pobreza, o problema será ainda maior

                 Por: Sílvia Bessa/
Por: Diario de Pernambuco
 (Foto: Hesíodo Goes/DP)
Foto: Hesíodo Goes/DP

Apenas três baldes dão conta da higienização pessoal e doméstica; o vaso sanitário é um buraco que despeja os excrementos na maré. Na palafita do pescador recifense Hamilton Ferreira, cidadão de 62 anos, pouco se previne o coronavírus. “Comprei sabão amarelo”, diz ele, fazendo o possível e o que pensa ser suficiente. Na comunidade pobre do Bode, bairro do Pina, no Recife, os riscos e as probabilidades de contágio por Covid-19 são muito maiores quando se trata de uma contaminação comunitária ativa, como se vê na capital pernambucana. O Bode e aglomerados urbanos carentes  ou com alta densidade populacional, em situação de favelização, são o grande temor de muitos especialistas. Neles, inimigos antigos se aliam ao coronavírus: a falta de água e saneamento, o desemprego e as estruturas familiares e residenciais.

“Às vezes, nesses lugares, não tem água encanada, recursos, não tem banheiro e, quando tem, o banheiro por vezes tem péssimas condições. São casas juntas demais. Isso tudo deixa eles mais vulneráveis”, diz Fátima Nepomuceno, médica de família há 24 anos (veja entrevista). Fátima integra hoje a coordenação das equipes de Saúde da Família do Recife. Medo por eles? “Sim, muito”, afirma, sobretudo ao mencionar os idosos - como é o caso de seu Hamilton.

Ontem, a Central Única das Favelas (Cufa), que atua em todo o Brasil, fez um alerta e divulgou um documento propondo medidas para reduzir o “enorme impacto da pandemia nas favelas”, que “visa um público fora das medidas formais adotadas” pelas autoridades.  Em particular “os que se encontram economicamente fragilizados e habitantes em território de desigualdade”. Entre as cobranças da Cufa estão a distribuição gratuita de água sanitária, sabão, álcool em gel e aluguel de quartos ou pousadas para idosos.

Em visita às ruelas da comunidade do Bode ontem, o coronavírus era assunto coadjuvante, minimizado. O Bode fica situado no Pina, que, junto com o bairro de Boa Viagem, desponta como líder de casos confirmados e suspeitos  de coronavírus até agora - conforme relatório epidêmico por bairro feito pela Prefeitura do Recife na última terça-feira.

Ontem, seu Hamilton lamentava a queda na venda do sururu que ele comercializa. O culto dançante da Igreja Batista da Restauração estava lotado, idosos e crianças se misturavam nas calçadas e ruas, jogavam dominó, bola, partilhavam objetos e viviam - como sempre - no improviso. Um cenário visto pela reportagem na 3ª Travessa da São Benedito e em toda a redondeza. “Aqui, a maioria está desempregada. Veja mesmo se dá para a gente comprar alimento”, afirma Valdenice Santana, de 53 anos, cujo maior temor é a falta de suporte de saúde para eventuais doentes. “Hoje mesmo vi na reportagem que a UPA que a gente frequenta estava fechada. A situação da gente é pior do que a da maioria”.

A duas quadras dali, Cristiane Oliveira, de 29 anos, via o filho Riquelme (2 anos) e o neto Benjamin (3 anos) tomando banho e desdenhava do impacto do coronavírus entre vizinhos e recifenses na mesma condição de vulnerabilidade que a dela: “Pobre não tem medo de pegar esse negócio porque a fome mata mais. A diferença é que ninguém faz passeata para isso”.

Além do Distrito Sanitário VI, que engloba Pina e Boa Viagem, outra área pobre da cidade que merece atenção especial é a do Distrito Sanitário III. Nesta, estão bairros como Casa Amarela e Alto do Mandu. Hoje, essa região ocupa o segundo lugar no quadro de casos confirmados e suspeitos.

A médica Fátima Nepomuceno dá ênfase também ao futuro dos morros. “Eles moram em casinhas, tem muita gente em casa dividindo espaço”. Levantamento feito pelo Diario sobre a densidade populacional do Recife mostra o quadro em especial do Alto José do Pinho, onde moram 298 pessoas por hectare. É o 2º no ranking populacional da cidade; o primeiro é Brasília Teimosa, ao lado do Pina, onde a densidade chega a 302 pessoas por hectare.

Risco futuro

Densidade populacional no Recife por bairros

Brasília Teimosa

Pes./hect
302,8
Pes./domic.
3,4        
Habitantes
18.334

Alto José do Pinho

Pes./hect
298,4
Pes./domic.
3,3        
Habitantes
12.334

Mangueira

Pes./hect
269,4
Pes./domic.
3,3        
Habitantes
8.480

Morro da Conceição

Pes./hect
265,2
Pes./domic.
3,4        
Habitantes
10.182

Alto Santa Terezinha

Pes./hect
245,7
Pes./domic.
3,6        
Habitantes
7.703

Casos por bairros
 (Fonte: Sesau/Recife/Gevepi/Cievs/Planilha paralela)
Fonte: Sesau/Recife/Gevepi/Cievs/Planilha paralela
 




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