quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

RESPONSABILIDADE PELA EXPLOSÃO DE VIOLÊNCIA SERÁ DO GOVERNO, AVALIA ESPECIALISTA

  Por:Rafael Tatemoto
Marcelo Camargo/Agência Brasil

O presidente Jair Bolsonaro (PSL) publicou nesta terça-feira (15) um decreto que flexibiliza a posse de armas no Brasil. Em 24 horas, a proposta foi criticada sob diversos pontos de vista.
Um das críticas tem a ver com o índice de feminicídios no Brasil, o quinto maior do mundo até 2016. No ano passado, mais da metade das mulheres assassinadas foram vítimas de armas de fogo. Ao eliminar a necessidade de crivo da Polícia Federal (PF), argumenta-se que, na prática, qualquer cidadão acima dos 25 anos poderia ter acesso facilitado a um armamento.
Nem a chamada "bancada da bala" ficou satisfeita, por acreditar que as alterações deveriam ser mais explícitas.
Para o economista Daniel Cerqueira, conselheiro do Fórum Nacional de Segurança Pública, o decreto de Bolsonaro ampliará o acesso à posse de armas, e terá um efeito explosivo: a taxa de homicídios "aumentará, e a responsabilidade será toda do governo".
Cerqueira é doutor pela PUC-RJ e analisa fenômeno da criminalidade a partir de metodologia econômica. Ele explica que, ao contrário do que afirmou Sérgio Moro – "se desarmamento fosse exitoso, país não teria batido recordes de homicídio" – a eficiência do Estatuto do Desarmamento deve ser auferida pelo número de mortes estimadas que evitou, desacelerando a taxa de crescimento do número de homicídios. Os argumentos dos que defendem flexibilização no acesso a armamento por aqueles que não são agentes de segurança pública são "retórica vazia", argumenta o especialista.
Confira abaixo os destaques da entrevista.
Brasil de Fato: O governo alega que o decreto apenas regulamenta formalmente dispositivos do Estatuto do Desarmamento. Qual sua interpretação?
A regulação acabou. Qualquer pessoa que quiser ter arma de fogo pode ter. É um "não-critério". O universo das pessoas com mais de 25 podem ter arma de fogo. Não há critério. É um liberou geral. Não tem dúvida, mais gente vai ter acesso a armas.
É um critério universal. Se coloca "estados com taxas de homicídio com mais dez por cem mil habitantes", são todos os estados. Ao colocar que basta explicar que tem efetivada necessidade e vai ser reconhecido como verossímil pela Polícia Federal, esses dois elementos fazem com que qualquer cidadão brasileiro com mais de 25 anos, que não responda a processo criminal, possa ter uma arma. Isso contraria o sentido do Estatuto do Desarmamento. Na verdade, é um decreto que revoga uma lei.
Mas o governo também argumenta que o decreto elimina a discricionariedade e a subjetividade na análise dos pedidos de registro.
É o argumento dos defensores do armamentismo. Se o objetivo era evitar a discricionariedade, poderiam ter sido colocados alguns elementos que indicam diretamente a necessidade efetiva, como por exemplo: ter sofrido ameaça de morte. Não foi o caso. O decreto é genérico.
É possível ter critérios específicos, e o melhor mesmo era que fosse ainda mais restritivo.
Há quem afirme, inclusive na imprensa, que há estudos contraditórios sobre o efeito da maior ou menor presença de armas entre a população e a taxa de crimes violentos. Existe algum estudo científico que possa embasar a flexibilização?
Não existe. O que existe é um retórica vazia, que pega situações casuísticas para tentar desmerecer um conjunto de estudos científicos nacionais e internacionais publicados em periódicos sérios. É um debate desigual. De um lado, tem a academia de forma unânime dizendo "mais armas, mais crimes" e, de outro lado, tem o abuso da retórica vazia falando "não é bem assim, os EUA têm mais armas e têm menos crimes que aqui".
Estão comparando bananas com laranjas, pegando um país desenvolvido e outro não-desenvolvido. Na verdade, para ter um critério científico, a relação entre armas e crimes não é única, há outros fatores intervenientes que afetam a criminalidade. Para fazer um estudo sério, é necessário isolar e controlar esses fatores.
Não existe nenhum artigo científico publicado nos grandes periódicos internacionais que mostre que mais armas diminuem crimes.
Então qual é o consenso acadêmico sobre a questão?
Mais armas, mais homicídios. E mais armas não têm efeito nenhum para diminuir crimes contra o patrimônio, ao contrário do que se propaga.
É possível afirmar seguramente, portanto, que a taxa de crimes vai aumentar? Mesmo se tratando de posse e não de porte?
Não tenho dúvidas que vão aumentar. Quando se olha crime no Brasil, vamos pegar todas mortes violentas e intencionais – as 64 mil: algo como 4% ou 5% são latrocínio. Em alguns estados onde a Secretaria de Segurança Pública fez estudos para tentar achar quais são as motivações, chegou-se a conclusão de que 20% são crimes interpessoais: feminicídio, briga de bar, briga de trânsito. A pessoa se envolve no conflito, tem arma na mão, perde a cabeça e gera uma tragédia. [O número de homicídios] Aumentará e a responsabilidade [política] será toda do governo Bolsonaro.
A miséria da Segurança Pública no Brasil começa exatamente quando a política e as leis são feitas a despeito das evidências científicas. Esse decreto vai contra o conhecimento científico. Vai contra a vida das pessoas. É a senha para aumentar a tragédia brasileira.


Blog do BILL NOTICIAS

Maioria dos americanos desaprova gestão de Trump na economia, diz pesquisa

  Pesquisa da CBS News mostra queda de quatro pontos nos índices de apoio às políticas econômicas do ex-presidente Presidente dos EUA, Donal...