segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

ERROS NO PROCESSO DEVERIAM ANULAR CONDENAÇÃO DE LULA, APONTAM JURISTAS


Por Naira Hofmeister, na Carta Maior
Em uma aula pública organizada pela Frente Brasil Popular diante da sede do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), em Porto Alegre, advogados e professores de Direito se revezaram ao microfone para apontar falhas processuais que deveriam levar à anulação da condenação do ex-presidente Lula, que consideram injusta. O ato ocorreu no final da manhã desta terça-feira (19), em Porto Alegre e reuniu algumas centenas de manifestantes vinculados a movimentos sociais, sindicatos, políticos e público em geral.

“Esse processo é nulo e gera uma sentença injusta que deverá ser assim considerada por este TRF4. Não há outra saída para o tribunal”, assegurou Carol Proner, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e integrante da Frente de Juristas pela Democracia.

Em julho, o juiz Sergio Moro condenou Lula a nove anos de cadeia por corrupção passiva no episódio do tríplex do Guarujá, considerado suborno por Moro. Compete agora ao TRF4 revisar a sentença, em um julgamento marcado para o dia 24 de janeiro – data que surpreendeu os juristas por duas razões: o prazo veloz com que foi concluída a revisão do voto do relator (cujo anúncio coincidiu com a divulgação de uma pesquisa de intenções de voto que colocava o ex-presidente como favorito à corrida presidencial) e o fato de ser período de férias coletivas na Justiça brasileira. “Gostaria de saber quantas apelações foram julgadas nessa época”, provocou o também advogado e professor da PUC-RS José Carlos Moreira.

A principal crítica dos juristas ao processo legal é a condenação de Lula sem “provas fáticas”. O juiz Sergio Moro entendeu que o apartamento foi entregue ao ex-presidente como pagamento de favores à construtora OAS, dona do empreendimento. “Só que o apartamento não está no nome de Lula e nem ele usufruiu do bem, o que poderia configurar o uso de um laranja”, alertou o professor Moreira.

Os juristas se insurgem também porque o juízo não teria conseguido apontar qual a vantagem obtida pela construtora em troca do suborno. E exemplificam citando a justificativa de Sergio Moro para a condenação, exposta em um congresso de juristas em São Paulo em agosto ( a sentença é de 12 de julho), quando disse: “Tenho a seguinte crença: assim como não existe almoço grátis, não há propina grátis. Sempre se espera alguma coisa em troca”.

“Além disso, em nenhum momento se diz quando aconteceu o fato: há uma janela de 1927 dias no processo, em que se argumenta que, em algum momento desse período houve a negociação, mas não se aponta quando foi pedido o apartamento, quando foi recebido….” prosseguiu o professor da PUC-RS.

“O crime de corrupção passiva tem que ter um ato de ofício, não é possível”, completou Carol Proner, que conclui que o processo configura “uso do direito para perseguição política”.

Para a também jurista e professora da PUC-Rio, Gisele Cittadino, o processo contra Lula é parte de um projeto de instalação de um regime de exceção no Brasil. “Começou no impeachment da Dilma, num claro desrespeito à soberania popular. Essa perseguição jurídica é a segunda parte do golpe e a terceira é retirar Lula do processo eleitoral”, analisa.

Os juristas são unânimes, entretanto, ao afirmar que mesmo em hipótese de confirmação da condenação do ex-presidente isso não significa impugnação imediata de sua candidatura – o que só pode ocorrer após o devido processo jurídico no Superior Tribunal Eleitoral a partir de 15 de agosto, quando devem ser registradas oficialmente as chapas concorrentes ao pleito.

“No Brasil a instrumentalização da Justiça e das leis serviu para dar um verniz de legalidade a vários atos durante a ditadura. Agora estamos vivendo uma situação semelhante”, lamentou Moreira.

O juiz acusador
Para o grupo de juristas, há falhas que rompem princípios constitucionais como os da isonomia pública e o direito à ampla defesa. Um exemplo são as atitudes do juiz Sergio Moro ao longo do processo, que os levam a crer que sua atuação não foi imparcial. “ Há uma evidente vontade condenatória que torna o juízo parcial, quando ele deve ser equidistante entre as partes. Tanto que muitas vezes se confunde juiz com acusador”, prosseguiu Carol Proner.

“Ele está julgando por presunção, sem provas, porque acredita que tem que haver corrupção, o que demonstra uma fragilidade do convencimento do juiz”, complementou.

Os professores de Direito mencionaram ainda o caso Tacla Duran - o ex-advogado das construtoras Odebrecht e UTC que denunciou fraudes e extorsão na obtenção de delações premiadas nos processos da Lava Jato. “O juiz Sergio Moro diz que não o escuta em audiência porque não tem seu endereço. Mas ele prestou informações em processos em sete países, só o Moro não consegue encontrá-lo”, provoca.

José Carlos Moreira fez um paralelo entre a atuação de Moro e o médico protagonista da novela O Alienista, de Machado de Assis. No conto, Simão Bacamarte decide salvar o mundo da loucura internando todos os que não passassem em testes que ele mesmo criava para enquadrar quem achava maluco. Como suas teorias eram furadas, ele vai mudando as hipóteses ao longo da narrativa, prendendo e soltando sem nenhum critério. A fragilidade da argumentação o leva a uma situação incontornável em que o próprio Simão Bacamarte se torna vítima e termina sendo internado no hospício.

“Este processo da Lava Jato é como um balcão de negócios em que os delatores são chamados a dizer o que interessa à narrativa desejada pelo juiz. Não há investigação e fatos, mas teses”, completou.

Eles condenam ainda a produção de provas ilícitas, como o grampo em telefones de escritórios de advocacia, o que fere o sigilo da relação com o cliente. “A companhia telefônica avisou ao juiz que aquele número era de um escritório e mesmo assim, o juiz

Sergio Moro manteve a ordem de escuta”, acusou Carol Proner. As gravações foram também divulgadas de forma irregular na televisão. “Ele mesmo admitiu que foi ilegal”, completou.

“Não estou pressupondo, eu sei que há muitos membros da Justiça e do Ministério Público com vergonha, sentindo-se acuados e pressionados com toda esta situação”, revelou o também advogado e professor da PUC-RS José Carlos Moreira.

População tem o direito de participar
Os movimentos sociais já anunciaram diversas ações ao longo do mês de janeiro, antecedendo o julgamento de Lula na segunda instância. A data marcada pelo tribunal coincide com a realização do Fórum Social Temático na capital do Rio Grande do Sul, o que poderá facilitar a adesão de nomes da esquerda internacional. O Movimento dos Trabalhadores Sem Terra já anunciou que acampará no Parque da Harmonia, que fica praticamente ao lado da sede do TRF4. Há adesões de muitos sindicatos, federações e partidos políticos à proposta.

“Este é um processo que prima pelas interferências externas: pressão da mídia, do presidente do TRF4 que elogia publicamente as decisões de Sergio Moro. A população também tem direito à assumir um papel de agente externo”, defende o cientista político e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul Benedito Tadeu Cesar.

A estudante Jéssica Pereira, integrante do Levante Popular da Juventude, que carregava um cartaz que reproduzia a Constituição brasileira considera a mobilização importante: “Esse é o momento da conscientização da população, para que compreendam a gravidade do que está acontecendo. A perseguição à Lula é uma forma de criminalizar os movimentos sociais”.

No carro de som, ao final da aula pública, o PSOL e o MST mandaram recados. Berna Menezes, representante da sigla socialista, lembrou que mesmo sendo oposição à Lula durante seu governo, o partido não concorda com a forma como o processo vem sendo conduzido: “Não admitimos que neste país a Justiça não cumpra a lei”. Ela lembrou ainda de excessos recentes em processos judiciais, como as prisões dos reitores de  UFMG e UFSC - este último caso, culminando com o suicídio do acusado. “Do outro lado temos a terceira maior população carcerária do mundo, a metade dela presa sem julgamento”, completou.

Uma das lideranças do MST e da Frente Brasil Popular, Roberta Coimbra, concluiu dizendo que “no Brasil, nunca vivenciamos uma plena democracia, mas neste momento o futuro e o nosso presente dependem da nossa capacidade de resistência”. (247).



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