Em comunicado publicado hoje (13), relatorias
especiais do Alto Comissariado de Direitos Humanos da Organização das Nações
Unidas (ONU) recomendam que o governo brasileiro tome atitudes necessárias para
conduzir uma revisão dos projetos de lei (PLs) que tratam do Escola Sem
Partido.
Segundo as relatorias, as autoridades brasileiras devem
assegurar a conformidade desses projetos com a base dos direitos humanos
internacionais e a Constituição Federal de 1988. A legislação protege o direito
à opinião, sem interferências, e o direito a buscar, receber e partilhar
informações e ideias de todos tipos, independentemente de fronteiras ou meios,
o que, segundo o documento, não está claro nos PLs. Os relatores pedem um
posicionamento do Brasil em 60 dias, mas a resposta não é obrigatória.
De acordo com o comunicado, por não definir o que é doutrinação
política e ideológica, propaganda político-partidária e educação moral, a
proposição permite "alegar que um professor está violando as regras pelo
fato de autoridades ou pais subjetivamente considerarem a prática como
propaganda político-partidária". Além disso, o Escola Sem Partido poderá
retirar das salas de aula, "discussões de tópicos considerados
controversos ou sensíveis, como discussões de diversidade e direitos da
minorias".
O documento é assinado por Koumbou Boly Barry, relatora especial
para o direito humano à educação; David Kaye, relator especial para promoção e
proteção do direito à liberdade de opinião e expressão; e Ahmed Shaheed,
relatora especial para liberdade de religião e de crença.
O Escola Sem
Partido é um movimento que alega que as salas de aula no Brasil são usadas como
ambiente de doutrinação, onde professores se aproveitam do ofício para repassar
aos alunos suas ideias políticas e morais. Para os defensores do projeto, essa
prática deve deve ser combatida por meio de legislações específicas. Já existem
propostas com esse teor em tramitação no Congresso Nacional e outras já
aprovadas em assembleias estaduais.
Por sua vez, aqueles que se posicionam de forma contrária
argumentam que já há na legislação vigente mecanismos para evitar abusos. Para
eles, uma lei como a proposta pelo Escola Sem Partido servirá para ameaçar e
criar um ambiente de insegurança em sala de aula, onde qualquer assunto
relacionado aos direitos humanos ou mesmo conteúdos históricos poderão ser
classificados como doutrinação.
O posicionamento das relatorias especiais da ONU destaca também
o impacto de ideias conservadoras defendidas no Escola Sem Partido na definição
da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), documento que define as competências
e os objetivos de aprendizagem dos estudantes a cada etapa da vida escolar O
Ministério da Educação retirou do texto final da BNCC o termo "orientação
sexual". Normas internacionais ratificadas pelo Brasil recomendam esforços
para combater a discriminação nos ambientes escolares, inclusive por orientação
sexual.
O posicionamento foi publicado após a entrega de documentos que
tratam do tema pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação e pelo Instituto
de Desenvolvimento e Direitos Humanos (IDDH). A relatora especial para o
direito à educação, Koumbou Boly Barry, esteve em evento promovido pela
Campanha Nacional pelo Direito à Educação e pela Ação Educativa em abril, recebendo
informações sobre o contexto da educação brasileira por meio de movimentos e
ativistas da área.
Escola sem partido
O movimento Escola sem Partido foi fundado em 2004 pelo advogado
Miguel Nagib. Em 2014, ganhou força quando se transformou em um projeto de lei
apresentado na Assembleia Legislativa Estadual do Rio de Janeiro (Alerj). O
movimento disponibilizou, então, dois modelos de projetos de lei, estadual e
municipal. Em âmbito nacional, projetos semelhantes tramitam tanto na Câmara
dos Deputados, quanto no Senado.
O texto estabelece, entre outras questões, que seja afixado na
parede das salas de aula de todas as escolas do país um cartaz com os deveres
do professor, entre eles o de não se aproveitar da audiência cativa dos alunos
para promover os seus próprios interesses, opiniões, concepções ou preferências
ideológicas, religiosas, morais, políticas e partidárias. (EBC).
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