A
negra Natasha Romero Sanches, de 44 anos, é uma doutora cubana.
Formou-se por uma universidade pública e, neste sábado, desembarcou no
Brasil. Já nesta segunda-feira, passará por um treinamento na língua
portuguesa, antes de ser enviada a um dos 701 municípios que não
atraíram o interesse de nenhum médico brasileiro e abrigarão
estrangeiros nesta primeira fase do Mais Médicos. Indagada por
jornalistas sobre o fato de parte da sua bolsa de R$ 10 mil ser
apropriada pelo governo cubano, ela não se queixou. “O meu salário é
suficiente”, disse ela, afirmando ainda que trabalha por amor e pela
vocação de salvar vidas (leia mais sobre a chegada de outros médicos
cubanos no site Tijolaço).
Aos olhos da jornalista Eliane
Cantanhêde, a doutora Natasha é uma escrava. Veio ao Brasil não num voo
comercial, mas num “avião negreiro” (leia mais aqui). Assim como
Cantanhêde, diversos outros jornalistas escreveram artigos ou postaram
mensagens no Twitter sobre a “escravidão” de cubanos. Foi o caso, por
exemplo, de Reinaldo Azevedo, de Veja.com, de Ricardo Noblat, do Globo, e
de Sandro Vaia, ex-diretor de Redação do Estado de S. Paulo – além do
inacreditável Augusto Nunes, que definiu o ministro Alexandre Padilha
como uma Princesa Isabel às avessas (leia aqui).
É possível que esses colunistas
realmente acreditem que os médicos cubanos foram escravizados pelos
irmãos Castro. E que o Brasil, sob as garras do PT, se converteu numa
brutal tirania que trafica pessoas – argumento que se enfraquece diante
do fato de que dezenas de países já assinaram convênios semelhantes para
a importação de médicos com o governo cubano.
Evidentemente, a doutora Natasha não é
uma escrava, assim como os outros médicos de Cuba que chegaram ao Brasil
neste sábado (para saber mais sobre o tema, leia o artigo de Hélio
Dolye sobre como funciona o sistema de remuneração dos profissionais de
saúde cubanos). O que todos eles pediram na chegada foi apenas respeito,
para que possam desempenhar bem as suas funções (leia mais aqui).
Mas será que Eliane Cantanhêde e seus
colegas são realmente pessoas livres? Eliane, por exemplo, se vê forçada
a criticar qualquer iniciativa vinculada ao Partido dos Trabalhadores e
até a inventar crises inexistentes. Foi ela, por exemplo, quem, no
início deste ano, anunciou um apagão iminente – que ainda não aconteceu.
Ela também esteve na linha de frente do chamado “lobby do tomate”,
apontando uma inflação fora de controle, que não se materializou.
Seus coleguinhas, muitas vezes, também
parecem presos e acorrentados a grilhões ideológicos. Funcionam num
sistema binário, que exclui a reflexão – se algo é ligado ao PT, só pode
estar errado. Ocorre que, muitas vezes, eles apenas vocalizam
interesses econômicos, políticos ou comerciais não deles – mas dos seus
patrões. Barões midiáticos que, num sistema ainda concentrado como o
brasileiro, distorcem o fluxo das informações. Basta dizer que, entre os
dez homens mais ricos do País, quatro são ligados a grandes grupos de
comunicação.
É possível que a doutora Natasha não
desfrute de toda a liberdade que gostaria de ter. Mas não se pode
descartar a hipótese de que ela seja uma mulher mais livre do que Eliane
e seus colegas que a vêem como uma escrava. (Brasil247)